Resenha Cultural: Próxima estação, Paris - Uma viagem histórica pelas estações do metrô parisiense de Lorànt Deutsch (Paz e Terra, 2011)

Que tal dar um passeio?

                O livro pode ser definido como um guia de reconhecimento da história de Paris tendo como ponto de referência o local das estações de metrô, que abrem-se como passagens no tempo. A experiência pessoal do autor de reconhecimento da cidade, quando se tornou seu habitante, aos 15 anos, transborda a paixão por essa urbe célebre. Tal qual um arqueólogo, escarafuncha os mínimos vestígios do passado, escondidos em edifícios particulares, cafés, muros, aos quais o acesso é raramente possível. No mapa do presente assinala as várias camadas de história, como o pesquisador benjaminiano de “Escavar e lembrar” e o júbilo com que o decurso do tempo pode ser experimentado ultrapassa a fronteira material das páginas e atinge o leitor.
                A 1ª estação situa-se na Cité, antiga Lutécia, ainda dividida em ilhotas, a cidade rústica dos gauleses. A seguir, a Place D’Italie. Aos poucos a cidade vai definindo contornos, sobrevivendo a várias tentativas de capitulação, na indefinição dos territórios do Império Romano, depois da Guerra dos 100 Anos, torna-se cristã, sedia a mais importante universidade do mundo...
                Salta-se do presente aos tempos pregressos em uma piscadela, a partir de um fragmento se dá a conhecer os vultos conformadores da sua historicidade, como Saint-Denis e sua basílica, o 1º exemplar do gótico em França, ou Santa Geneviève, a primeira heroína parisiense. Relatos históricos nos fazem conhecer o significado de prédios como o Châtelet - prisão e local de tortura, que tornou-se no século XII sede da administração da cidade. O prédio foi demolido em 1804, e dele se pode notar alguns vestígios no Caveau des Oubliettes.
                Na Estação Philippe Auguste, fora das muralhas da Paris do século XII, encontra-se a imponente muralha, de 9 m de altura, erigida por ordem deste  soberano, uma parte dela guarnecida pela fortaleza do Louvre, tornada castelo em 1527 por Francisco I, o monarca que acolheu Leonardo da Vinci.
                Na Place Maubert, local de saída da Estação Maubert-mutualité, onde no passado padres proferiam suas lições aos estudantes, originou-se a Sorbonne. Lá ergueu-se no século XII a Igreja dedicada a Saint-Julien-le-Pauvre, que, sob o reinado de S. Luís deixa de abrigar a universidade para que esta se estabeleça na Sorbonne, fundada em 1257 pelo confessor do rei, Robert de Sorbon.
                Na Estação Palais-Royal-Musée du Louvre encontra-se o palácio, construído para residência do Cardeal Richelieu, situado próximo ao Louvre. A seguir a Estação Invalides leva a uma das grandes obras de Luis XIV, o Hotel para os inválidos de guerra. O projeto do prédio esteve a cargo de Libéral Bruant, o arquiteto que construíra o hospital de Salpêtrière, porém a igreja foi projetada por Jules Hardouin-Mansart, autor das mansardas, aberturas presentes nos sótãos dos edifícios parisienses.
                Na estação Bastille, encontram-se algumas pedras amareladas da fundação do muro da Bastilha. Hoje o local abriga uma Ópera moderna, onde fora uma prisão destinada aos nobres delinqüentes, a qual foi tomada durante o 14 juillet, dia-marco da Revolução Francesa.
                Durante o século XIX os Napoleão sucedem-se no poder: o presidente da república Luís Napoleão torna-se imperador Napoleão III, e propõe-se a remodelar Paris, destruindo o Boulevard du Crime e expandindo os limites da cidade até as fortificações: Auteuil, Passy, Montmartre, Belleville integram-se aos arrondissements. Esta é a capital do 2º Império, estudada por Benjamin em Paris - capital do século XIX: o livro das passagens.
                Atravessando os Champs-Elysées o século XXI chega em La Défense, cujo Arco, de 1989, alinha-se em perspectiva ao Arco do Triunfo. Neste capítulo, o autor não poupa críticas aos edifícios contemporâneos de mau gosto, perguntando: “que herança o século XXI transmitirá às gerações futuras?” Pergunta que pode ser aplicada a todas as cidades que, como Belém, vem substituindo a arquitetura harmoniosa dos séculos XIX e XX por gigantes egoístas que degradam a paisagem da cidade.
                Apesar do saudosismo instigado pela busca de vestígios das camadas pregressas da cidade-luz, o autor deixa notar a criação de novos monumentos, que são hoje marcos de sua identidade. Curiosidades que servirão a quem pretende visitar Paris, ou conhecê-la a partir das minuciosas descrições... De todo modo, uma leitura agradável, cheia de personalidades históricas, que servem para contextualizar os monumentos tão repetidos nos postais.

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