Iniciação à obra de Visconti


LUCHINO VISCONTI (Conde Di L. V. di Modrone) - realizador de filmes e diretor teatral italiano, nascido em 2 de novembro de 1906 em Milão, onde morreu em 1976. Instável, hipersensível e atormentado, este herdeiro da 1ª família nobre de Milão fugiu várias vezes e após teve uma breve, mas violenta crise mística. Após o serviço militar se retira do mundo, não para entrar num convento, mas para se consagrar ao “melhoramento da raça de cavalos” como ele diz. Após, parte para Paris. Aos 30 anos, torna-se assistente de Jean Renoir – foi desenhista de costumes de Une partie de campagne. Na França de 1936, o clima era muito diferente da Itália de Mussolini. Visconti reflete, discute e se engaja na política, influenciado pela Guerra da Espanha e a Frente Popular. Em seguida volta-se para os Estados Unidos e se decepciona com Hollywood: a vida americana lhe parece insípida. Sua origem aristocrata o faz voltar-se para a “velha” Europa e seus problemas humanistas. Com Jean Renoir realiza na Itália “A Tosca”. Colabora com a Revista “Cinema” dirigida por Vittorio Mussolini mas onde ele exprime em filigrana o pensamento de esquerda da jovem geração. Ele reclama do ‘verismo’ de Giovanni Verga, o romancista mais importante do século XIX na Itália, cujas obras são suspeitas ao regime. Não consegue filmar uma obra de Verga, volta-se então para o romance de James Cain “O carteiro toca sempre duas vezes” (já filmado antes por Pierre Chenal). Esta estória de origem psicológico-policial é transposta ao cinema de modo que os subentendidos escaparam à censura. 
                Com “Obsessão” inaugura o neorealismo (1942): pinta um quadro preciso da miséria do povo italiano, denuncia a propaganda oficial e o regime fascista, desagradando as autoridades religiosas e civis que nele viram “o imoralismo”. Escapando do caligrafismo e do esteticismo em honra de um cinema italiano de época, Visconti afirma o valor humano do cinema na medida em que contesta e reivindica. “O cinema que me interessa é um cinema antropomórfico” declara em 1943. Confia no ator não profissional e diz “eu poderia fazer um filme diante de um muro, se eu soubesse reencontrar os dados da verdadeira humanidade dos homens colocados diante de um elemento decorativo nu.” Esta concepção dum antigo decorador, Visconti põe em prática em La Terra trema. Após Obssessione, roda um filme sobre guerrilheiros chamado Jours de gloire (1945), tem um projeto de Othelo e monta a peça Le parents terribles de Jean Cocteau (1945), além de 11 peças (Sartre, T. William, Jean Anouilh etc) A linguagem teatral difere da cinematográfica pelo enquadramento único do cenário, as dificuldades de movimento, de luz, de cor e magia. La Terra trema provará que um filme de inspiração marxista, ilustrando a luta de classes, deu lugar às pesquisas estéticas originais. Tenta adaptar Carose Du Saint Sacrement de Merimée e abandona o cinema até 1951 quando filma Belíssima, sátira do mito social que representa o cinema, com Anna Magnani; reflete sobre as linguagens do cinema e do teatro.
                Fez Rosalinda (1954) e As três irmãs ou Comme les feuilles, evoluindo do neorealismo ao cinema de espetáculo. Rompe com o hegelianismo, e o marxismo não é instrumento suficiente para explicar um mundo einsteiniano. Senzo é “realismo romântico”, é obra de um Sthendal cineasta que ultrapassa Hegel e Marx. O humanismo de Visconti não se satisfaz em considerar o Homo historicus material, objeto e sujeito ao mesmo tempo da história. Personagens e fatos são situados no máximo de precisão possível que pertencem a nossa época e não ao Renascimento. Noites Brancas (1957) baseado em Dostoievsky retoma o verismo de Verga, magistral com Rocco e seus irmãos (1960) e o Leopardo (1963) abriu todas as portas.
                Um tema recorrente nos filmes de Visconti é a desintegração moral da família, um painel sobre a transposição trágica do proletariado siciliano para a Milão industrializada em Rocco e seus irmãos, até a decadência da rica família Krupp em Os malditos, Crepúsculo dos Deuses, O leopardo e Vagas estrelas da Ursa. Em 1971 fez Morte em Veneza, interpretação pessoal da obra de Thomas Mann.

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