Resenha da Tese "Inspeção de fachadas históricas: Levantamento de materiais e danos de argamassas de revestimento"

Por Zâmara Lima (Bolsista PIBIC- FAPESPA LAMEMO)
Carlos Teles em sua tese utiliza-se de duas edificações do Rio de Janeiro (Paço de São Cristóvão e Museu da Casa da Moeda do Brasil) para a pesquisa. O estudo consiste na preservação das fachadas dessas edificações históricas propondo métodos de restauro para o levantamento de danos em argamassas de revestimento.
A tese possibilita uma visão geral sobre a questão patrimônio/restauro fazendo um apanhado de manifestos e das cartas patrimoniais, que são considerados norteadores da prática de Conservação Cultural, e aborda a importância da preservação das fachadas. “A fachada além das funções primordiais de proteção, vedação e contato, de acordo com John Marston Filch (1997), é uma forma de comunicação do proprietário com a sociedade.” No entanto, Teles destaca que a preservação das fachadas é importante não só pela memória coletiva, mas evita prováveis acidentes que podem acontecer devido à degradação do edifício.
O Projeto Monumenta, do Ministério da Cultura, é abordado, no qual dentre o conjunto de publicações está o Manual de Elaboração de Preservação do Patrimônio Cultural (GOMIDE, SILVA E BRAGA, 2005). A abordagem desses documentos é importante no trabalho, pois esclarecem termos utilizados na restauração, conceitos, métodos e técnicas inclusive sob a experiência de outros autores.
Existe a preocupação com a forma de intervir no edifício histórico para conservar ao máximo suas características originais. Para tanto o autor descreve minuciosamente o processo de intervenção desde a preparação do levantamento de campo à seleção de análises laboratoriais.
Uma das primeiras medidas é interromper a infiltração de água, já que a umidade está relacionada ao processo de degradação. Após uma análise das informações quanto à significação cultural e a condição do edifício deve ser decidida, pelo arquiteto, a melhor forma de intervenção no mesmo já que existem algumas ponderações sobre as patologias existentes na edificação, originalidade da argamassa reforçada com polímeros modernos ou da argamassa baseada na original e a sua respectiva durabilidade, por outro lado, o desejo de preservar ao máximo a matéria original.
Utiliza-se das fachadas do Paço de São Cristóvão e do Museu CMB para demonstrar de forma esquemática a cronologia do edifício destacando os estilos de fachada que foram incorporados ao edifício ao longo do tempo. O autor demonstra os elementos arquitetônicos presentes nas fachadas e faz o mapeamento dos danos demonstrando que cada zona dessas está sujeita a um tipo de degradação diferente.
São abordadas as patologias mais comuns em argamassas históricas. No decorrer do trabalho tem-se a possibilidade de conhecer as causas dessas patologias, como reconhecê-las e qual o método mais indicado e que foram utilizados na pesquisa, descrevendo todo o processo.
Fica explícita nesse trabalho a importância de uma inspeção visual e o reconhecimento do edifício para a percepção dos diferentes tipos de argamassas existentes e degradações. Para isso, são indicados a princípio ensaios não destrutivos para colher informações e propriedades físicas e mecânicas quando houver dúvidas na inspeção visual.
Dentre os métodos de levantamento qualitativo e quantitativo de danos, o autor aborda questões a serem respondidas e indica o método de percussão, que consiste na utilização de um martelo com cabeça metálica e pontas em ABS para através do som em contato com a superfície fazer a distinção entre argamassas sãs e com algum tipo de degradação.
Na fase de retirada de amostras deve-se tirar apenas o mínimo necessário obedecendo ao princípio da intervenção mínima, porém considerando que para ser bem sucedida é fundamental ter registros fotográficos, técnica de retirada, características da amostra, fase histórica, cor, função, possível ligante, condição, material de construção associado, objetivo de estudo e análises propostas.

Mapa esquemático indicando os locais aproximados da retirada de corpos de prova (sem escala) onde as fachadas são nomeadas por letras conforme a orientação: Fachada N (norte) e Fachada W (oeste). 

Apesar de não ser o foco da pesquisa, o autor comenta as fases de análises laboratoriais que leva em consideração os equipamentos e os técnicos disponíveis em um laboratório conforme o objetivo da investigação. Dentre eles estão: a análise petrográfica, difração de raios-X e microscopia eletrônica que podem inviabilizar a pesquisa devido ao alto custo da análise. Todos esses métodos são utilizados para diferenciar materiais, suas composições e assim reconhecer a natureza da argamassa.
Ao final do trabalho percebeu-se que o dano mais recorrente nas fachadas foi o descolamento de placas e são apresentadas as possíveis causas: impurezas da matéria prima, que favorecem um comportamento de retratação e expansão com a umidade, bem como vícios de execução, pois a ausência de uma camada de interface (chapisco ou leite de cal) e uma compressão inadequada da argamassa contra o substrato leva à má aderência ao substrato e ao descolamento em placas.
Concluiu-se, portanto, que a degradação nessas edificações é atribuída à argamassa e sua execução, o que indica que futuramente deverá apresentar os mesmos danos, pois “a reancoragem da argamassa ao substrato não interromperá o processo de degradação que voltará a ocorrer”.
É interessante como o autor descreve toda a experiência e faz o embasamento teórico para as escolhas de métodos e técnicas mais viáveis, inclusive do ponto de vista econômico e prático. Essa tese funciona como um verdadeiro manual para quem se interessa em conhecer os processos de restauro em edificações históricas.


Fonte: TELES, Carlos Dion de Melo. Inspeção de fachadas históricas: Levantamento de materiais e danos de argamassas de revestimento. Tese (Doutorado em Arquitetura) – Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo;Área de concentração em Arquitetura, Urbanismo e Tecnologia, Universidade de São Paulo, São Carlos. 2010. p.178.


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